sábado, 24 de agosto de 2013

Henfil – Política e humor na época da ditadura militar




Desenhista, jornalista e escritor, Henrique de Souza Filho, ou Henfil, como ele assinava seus trabalhos, foi um dos principais nomes do desenho humorístico brasileiro. Por meio de um humor ácido e inteligente, dotado de uma pesada carga de ironia, Henfil conseguiu burlar a censura e expor suas ideias, dizendo o que grande parte da população brasileira engajada na luta pela democracia gostaria de poder dizer. Com seu desenho irreverente e bem humorado, o cartunista construiu uma das mais importantes formas de oposição ao regime ditatorial no país, adquirindo grande importância no processo de transição democrática. 




Cada um dos personagens de Henfil possui também suas particularidades. O cartunista criou personagens tipicamente nacionais, como a Graúna, o Bode Orelana e o Capitão Zeferino, “direto da Caatinga”, ou os Fradinhos cumprido e baixinho que, em seus diálogos, criavam metáforas da sociedade e do governo em sua época. Desta forma, Henfil contribuiu drasticamente para a fundação dos quadrinhos nacionais, lutando pela “descolonização” em um período em que as HQ’s brasileiras se viam sufocadas pela distribuição de quadrinhos norte-americanos, ou mesmo pela censura em si.


Biografia
Desenhista, jornalista e escritor Henrique de Souza Filho, mais conhecido como Henfil, nasceu em 1944, na cidade de Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, e cresceu na periferia de Belo Horizonte. Lá ele frequentou um supletivo noturno e posteriormente um curso superior em Sociologia, do qual desistiu após alguns meses.
Trabalhou como embalador de queijos, boy em uma agência de publicidade e jornalista, até que, no início da década de 1960, especializou-se em ilustração e produção de histórias em quadrinhos. No ano de 1964, entrou para a revista Alterosa, de Belo Horizonte, convidado pelo editor e escritor Robert Dummond. Na revista nasceu originalmente a HQ Os Fradinhos. 
Em 1965, Henfil passou a produzir caricaturas políticas para o jornal Diário de Minas e, em 1967, criou charges esportivas para o Jornal dos Sports, do Rio de Janeiro, tendo seu trabalho também publicado nas revistas Realidade, Visão, Placar e O Cruzeiro.

Mudou-se para o Rio de Janeiro onde, a partir de 1969, passou a colaborar para os jornais O Pasquim e Jornal do Brasil, o que deu a seus personagens desta época grande popularidade no Brasil inteiro. Em 1970, Henfil lançou a revista Os Fradinhos. Nesse momento de sua carreira, a produção de histórias em quadrinhos e cartuns de Henfil já apresentava características específicas: traço simples e humor ácido, rápido e ligeiro.
Henfil trabalhou também com teatro, cinema, televisão (foi redator do extinto programa TV Mulher, na Rede Globo) e literatura, mas ficou marcado mesmo por sua atuação nos movimentos sociais e políticos brasileiros. Após uma década de trabalho no Rio de Janeiro, Henfil mudou-se para Nova York, onde passou dois anos em tratamento de saúde e escreveu o livro Diário de um Cucaracha. Ele até tentou seguir carreira nos Estados Unidos, mas não teve lugar nos tradicionais jornais americanos, sendo renegado a publicações underground. Henfil retornou então ao Brasil, publicando mais um livro.

O cartunista obteve grande destaque por seu posicionamento político e seu engajamento na luta contra a ditadura militar no Brasil, buscando a democratização do país, a anistia aos presos políticos e as Diretas Já. Henfil passou toda sua vida a defender o fim do regime ditatorial pelo qual o Brasil passava. Ele é um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores. Há inclusive inúmeros materiais de divulgação do Partido e de campanha eleitoral ilustrados por ele.
Henfil morreu, aos 43 anos, no ano de 1988, no Rio de Janeiro. O cartunista era hemofílico (como seus dois irmãos, o sociólogo Betinho e o músico Francisco Mário). Henfil contraiu Aids em uma transfusão de sangue, fenômeno que infelizmente era comum na época, uma vez que havia ainda pouco conhecimento sobre a doença e os cuidados específicos para preveni-la.

Personagens
Henfil tinha como característica de seu trabalho um desenho humorístico político, crítico e satírico, com personagens tipicamente brasileiros e um humor ácido, carregado de ironia e metáforas. Seguem alguns deles:

Ubaldo, o paranoico
Ubaldo foi inspirado em seus criadores e em tantos outros intelectuais da época. Criado em 1975, numa parceria com jornalista Tárik de Souza, o personagem assimilava em seu quadrinho a forma de agir e a paranoia obsessiva de perseguição causada pelas situações recorrentes em relação ao terror da tortura. Os quadrinhos sempre apresentam a figura da charge em uma situação de medo eminente, utilizando traços para dar características de movimento trêmulo, e técnicas para conferir ao personagem expressões de medo e delírio.

Cumprido e Baixinho
Os frades Cumprido e Baixinho possuíam personalidades completamente diferentes. Cumprido se caracterizava por sua ingenuidade e extrema bondade, enquanto o frade Baixinho, por sua vez, esbanjava sarcasmo e toda uma coleção de maldades (que incluíam, dentre outras coisas, o sadismo e comportamento repulsivo).

Graúna, Bode Orelana e Zeferino
Direto da Caatinga nordestina vinham a Graúna, o Bode Orelana e o Capitão Zeferino. Graúna era uma ave que tinha a forma gráfica de um ponto de exclamação, e aparecia com frequência nas histórias; o bode Francisco Orelana, por sua vez, era um animal culto que se informava comendo revistas e jornais; Por fim, havia o cangaceiro Capitão Zeferino, que se destacava pelo jeito bruto, rústico e sistemático de ser.



CabôcoMamadô
Cabôco possuía um cemitério atípico onde enterrava apenas pessoas que estavam ainda vivas. Por meio deste personagem Henfil tecia críticas a pessoas que, segundo ele, haviam  colaborado de algum modo com a ditadura. Quando Elis Regina fez um show para o exército brasileiro em 1972, Henfil publicou no Pasquim uma charge em que enterrava a cantora, apelidando-a de "regente" . No desenho estavam presentes também outras personalidades que, na ótica de Henfil, agradariam aos interesses do regime, como os cantores Roberto Carlos e Wilson Simonal, o Jogador Pelé e os atores Paulo Gracindo, Tarcísio Meira e Marília Pêra. Elis protestou contra as críticas, e em resposta, Henfil enterrou-a novamente.




Texto: Lucas Gandra, Everton Marques, Hugo Amichi e Rodrigo Cupertino 







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